o (grande) autor, há muito tempo que tem a mania que escreve.
assim, deixo aqui uma descrição de uma ceia de natal, escrita por esse moço no dia 16/10/99.
qualquer semelhança com a família do (grande) autor é mais do que uma coincidência.
O som vindo da sala de estar da casa era assustador.
Cerca de 24 pessoas falavam, gritavam, expunham ideias todas ao mesmo tempo…todas na esperança de que as outras as ouvissem e não prestassem atenção à conversa vinda de apenas um meio metro dos seus tímpanos.
Era noite de natal, mas mesmo assim não eram dadas quaisquer tréguas e todos queriam falar mais alto que os outros, resultando num som que chegava aos ouvidos das pessoas que habitavam nos três andares inferiores.
A avó reclamava que a sua pensão ainda não tinha chegado e que já ia com duas semanas de atraso, a tia falava na sua operação bem sucedida ao rim esquerdo, o tio contava todos os detalhes, bastante importantes para a ceia de natal, deixando os provadores do bacalhau de mau aspecto, em agonia, agravada esta pela excelente descrição de como o bisturi cortava partes do interior da tia, fazendo espirrar algum sangue para a bata do doutor…enfim, o normal.
Numa divisão mais distante da sala, um dos primos mais pequenos pegava fogo a uns quantos papéis da secretária do avô, papéis parecidos com os do banco, relativos ao empréstimo contraído para o finalizar das obras da cozinha, onde nesta, uns miúdos, supostamente primos, se despachavam a acabar com todas as sobremesas, que também não tinham um aspecto muito saudável.
Após toda esta maravilhosa ceia, todos se reuniram na sala-de-estar, esperando um suposto Pai Natal, que se vestia num dos quartos do fundo, rezando para que, ao aparecer na varanda, carregando quarenta e três quilos de prendas, nenhum dos primos mais pequenos o fizesse tropeçar num fio de nylon, previamente esticado à entrada da varanda e o fizesse cair, partindo o queixo, tendo de levar doze pontos, como sucedera no ano anterior.
Assim, enquanto todos estavam na expectativa de receberem mais um par de meias, ou uma sempre útil cassete de vídeo, ou ainda então um ainda mais surpreendente after-shave, com 79% de álcool , a tia-avó Zulmira discutia com a avó Etelvina o facto de ter gasto uns incríveis 1,55€ num pisa-papéis comprado numa loja recondita da Av. Das Forças Armadas para dar à sua sobrinha-neta mais nova, a Joaninha, de 1 ano e meio, tendo sido esta a sua prenda mais cara:
- E então não é que os sacanas dos monhés lá da loja me queriam vender a porcaria do pisa-papéis por 2,50€, só porque parecia que tinha pepitas de ouro lá dentro…e eles até diziam que eram pepitas verdadeiras, parece impossível, não é ?
Ao que a avó ripostava:
-Pois é, esta gente agora está tudo doida, veja lá que a mim me pediam 3€ por dois pares de meias ali nos ciganos do Saldanha, é claro que acabaram por baixar para os 2 euricos, que eu até achei caro, mesmo assim…
-Pois é, pois é, agora não se pode confiar em ninguém, e então já soube que a nossa querida amiga Gertrudes, no dia em que fez 79 anos, quando ia a atravessar a rua, reparou que o sinal estava vermelho, e então parou, só que parou já no meio da passadeira e levou com um rapazinho que lá vinha numa daquelas máquinas da morte, as bestas…
-Ah! As vespas!
-Sim, sim, isso, bem, como eu ia a dizer, a nossa pobre amiga ficou tipo aqueles desenhos-animados, toda espalmadinha no chão e o rapaz da mota só partiu a cabeça, a perna esquerda, o braço direito e o pé esquerdo, esse assassino! Mas diz que a Gertrudes não tinha tomado os comprimidos nessa manhã, e por isso é que achou que o melhor era parar a meio da passadeira. Estava baralhada, a pobrezita...
-Pois é, naturalmente esqueceu-se. Olhe, eu também acho é que ela já estava com os pés para a cova há muito tempo e só estava cá a estorvar…Deus me perdoe, mas é assim que eu penso.
-Pois, mas é assim…olhe, já lá vem o Tiaguinho a fingir de Pai Natal… eu nem sei como é que os miúdos ainda acreditam nele, o rapaz nem sequer trouxe a barba de Pai Natal !!!!
(continua)
Há 1 semana
1 comentário:
LOL
a conversa é no mínimo surreal...
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